Outro dia, numa daquelas trocas de áudio longas e boas com meu amigo Daniel (um ser maravilhoso que habita esse planeta), me deu vontade de fazer esse texto. Eu falava sobre a dificuldade de equilibrar as coisas: o trabalho que paga as contas, os projetos que podem dar em algo e aquelas poucas coisas que, no fundo, a gente sabe que vão construir nosso futuro. Lembrei dessa estrutura que eu já usei pra outras reflexões e desenhei um mapa em porcentagem: 70, 20 e 10.
A conversa me pegou de tal jeito que passei os dias seguintes pensando nisso como já uso isso intuitivamente. Mas como meu foco é um bichinho muito sensível, preciso transformar ideias em guias, se não vira só algo “massa” que não me ajuda. Virou uma espécie de régua mental para entender para onde meu esforço (e minha alma) está de fato escorrendo.
Os 70% — O Inegociável
Essa é a base, o núcleo. São as responsabilidades que a gente tem que cumprir com unhas e dentes. As entregas do trabalho, as contas pra pagar, os compromissos assumidos. É a estrutura que mantém o resto de pé. Não há muita poesia aqui, é o feijão com arroz que garante a energia para o resto do prato. Negligenciar os 70% é irresponsabilidade; a casa cai.
Os 20% — A Sereia Sedutora (e perigosa)
Ah, os 20 por cento. Aqui mora o perigo. Essa é a fatia das coisas novas, divertidas, interessantes. Aquela IA que parece ter tudo a ver com seu trabalho, aquele curso sobre um tema periférico, aquela nova ferramenta que promete revolucionar tudo.
Os 20% são sedutores porque eles fingem ser úteis. E às vezes até são, de verdade. Trazem um diferencial, nos posicionam de um jeito interessante. O problema é o custo de oportunidade. Eles são uma distração brilhante que nos desvia daquilo que é realmente estratégico. São um "supérfluo necessário" que, sem vigilância, pode virar 80% da nossa atenção e nos afogar.
Os 10% — O Futuro Sendo Plantado Hoje
E aqui, neste cantinho, moram as joias. Os 10% são os investimentos de tempo e energia com o maior poder de retorno a longo prazo. São as habilidades que, daqui a cinco anos, vão fazer uma diferença brutal.
Lembrei de uma planilha de finanças pessoais que aprendi a programar há tempos. Na época, parecia um desvio, quase um capricho. Tomou um tempo que eu "não tinha". Hoje, ela é uma ferramenta central na minha vida, que me economiza horas e me ensinou a resolver problemas usando código. Aquele foi um investimento de 10%.
Esses 10% precisam ser protegidos com a vida. São eles que garantem que a gente continue inovando, relevante, resolvendo problemas de médio prazo e, no fim das contas, construindo quem a gente quer ser. O problema? A sereia dos 20% vive tentando roubar o microfone e o tempo dos 10%.
A dança desequilibrada dos números
A verdadeira batalha diária é essa: proteger os 10% da ganância dos 20%, sem deixar os 70% desmoronarem.
É perceber que aprender a programar para fazer uma parada para as finanças pessoais (10%) não é a mesma coisa que se perder em dezenas de artigos sobre a nova IA da semana (20%). Um constrói um ativo; o outro, na maior parte do tempo, só coça uma curiosidade que não leva a lugar nenhum.
O desafio, então, é ser brutalmente honesto na hora de classificar nossas tarefas. Isso que estou fazendo agora... é 70, 20 ou 10? É uma base sólida, uma sereia sedutora ou uma semente para o futuro?
Não tenho resposta pronta, só o mapa torto que saiu da conversa. E a lembrança de que, às vezes, o 10% vira 30% de tão importante. E, se a gente não vigiar, os 20% viram 80% e a gente termina o dia com a sensação de ter feito muito, mas sem ter construído nada.
E você? O que anda ocupando seus 20%? E, mais importante, o que você faria se protegesse de verdade os seus 10%?